Morte da mãe por obesidade fez pedagoga procurar remédios


Medicação usada foi proibida pela Anvisa na semana passada.
‘As pessoas falavam que eu andava muito eufórica’.

Maria Cristina perdeu o peso que incomodava, mas só conseguiu manter quando aprendeu a reeducar a alimentação e fazer exercícios (Foto: Egi Santana/G1 BA)

Maria Cristina Ramos, 61 anos, estava com 88 quilos em 2004, quando procurou uma endocrinologista para receitar o tratamento adequado para alcançar o peso ideal, cerca de 65 quilos. A pedagoga conta que a médica ofereceu as opções de se tratar com ou sem o uso de medicamentos. Mas ela tinha pressa.
"Eu estava angustiada porque minha mãe havia falecido há pouco tempo e nós acreditamos que foram por complicações derivadas da obesidade. Por isso, preferi os remédios" explica. Cristina começou a tomar uma fórmula receitada pela médica que, dentre outras substâncias, havia a presença de anfetaminas [remédios que aumentam a atividade cerebral] e diazepan [droga tarja preta usada no combate à ansiedade].
O tratamento durou sete meses, e no período Cristina relata que se sentia bem, mas com um excesso de energia. "As pessoas me falavam que eu andava muito eufórica, mas para mim, a rotina com pouco mais de três horas de sono e as horas de exercícios físicos por dia não incomodava. Pelo contrário, eu estava perdendo peso e ainda me sentia ativa", diz



Os problemas vieram quando ela fez uma viagem de férias e o remédio acabou. "No primeiro dia eu senti insônia. Do segundo dia em diante eu comecei a me sentir sem forças, com mal estar, passava mal o tempo todo, fiquei em depressão. Era o começo de uma crise de abstinência da droga”, conta a pedagoga.
Cristina tentou entrar em contato com sua médica, que informou que aquele era um caso inusitado. Descontente, ela antecipou a volta da viagem e procurou um novo endocrinologista.
Após os exames preliminares, o médico detectou uma hipoglicemia [falta de açúcar no sangue] e prescreveu soro com glicose, quando Cristina desmaiou. “Eu só lembro dos médicos apertando o soro para aquilo entrar rápido nas minhas veias”, diz. Após novos exames, foi detectada uma sobrecarga cardíaca na pedagoga. Cristina ainda precisou respirar com o auxílio de balões de oxigênio.
Mas esses não foram os únicos problemas. Para se recuperar da abstinência, ela fez um tratamento psiquiátrico por cerca de quatro meses, acompanhada do uso de novos medicamentos. “Foi uma fase muito difícil da minha vida. Além de todos os efeitos colaterais que o remédio me trouxe, foram meses para a recuperação e um trauma para sempre”, pontua.
Apesar dos problemas, ela não desistiu dos cuidados com a saúde. Só que, dessa vez, preferiu optar por métodos menos agressivos. “Voltei a consultar médicos e procurei um método sem a necessidade do uso de medicamentos. Foi aí que eu comecei um tratamento para reeducar a minha alimentação. Nos cinco meses do novo procedimento, passei por fase de dietas, de redução de carboidratos, além de tratamento com psicólogos especializados na reeducação. Hoje, passados mais de cinco anos, consigo manter o meu peso, comendo de tudo com consciência”, explica.
“A partir do momento em que você entende um pouco sobre o funcionamento do seu corpo e sobre aquilo que come, é possível seguir com uma dieta saudável e sem restrições. Hoje eu faço apenas 30 minutos de atividade física por dia e, na cozinha, ‘seguro as pontas’ durante a semana e bebo meu uísque, minha cerveja, como ‘besteiras’ no final de semana. Dá pra ser feliz e viver com saúde”, comemora.
Combinação perigosa
Para Rosana Radominski, endocrinologista e presidente da Abeso, no caso de Maria Cristina, o pouco tempo entre o início do tratamento com remédios e o luto pela morte da mãe podem ter contribuído para o resultado ruim com os inibidores. "Acredito que ela deveria ter se recuperado adequadamente da morte do parente querido antes de iniciar o tratamento", afirma a especialista.
"Ela tinha um problema emocional importante, talvez tivesse uma certa propensão à dependência química", diz Radominski. "A combinação entre emagrecedores e ansiolíticos pode ter colaborado para essa crise de abstinência relatada."
Efeitos colaterais podem ocorrer após o uso de emagrecedores. "Existem pessoas que respondem bem às medicações e outras que apresentam esses problemas", explica a médica.
Sobre a pressa que Maria Cristina apresentou ao recorrer aos remédios, Radominski acredita que exista uma distância entre as expectativas de pacientes e médicos durante o tratamento. "A pessoa normalmente quer perder peso rápido e o profissional de saúde está mais preocupado com a saúde do paciente."
Como o próprio exemplo de Cristina demonstra, muitas vezes o controle do peso pode bastar para evitar problemas de saúde, mesmo que a pessoa não atinge o patamar ideal. "Ao perder de 5% a 10% do peso, o paciente já apresenta boa melhora na maioria dos casos", afirma a médica. "Em alguns casos, é difícil que o paciente alcance o peso ideal, mas ele pode viver normalmente, sem riscos à saúde."


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